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EDUCAÇÃO INICIÁTICA OU ANDRAGÓGICA

EDUCAÇÃO INICIÁTICA OU ANDRAGÓGICA

EDUCATION INITIATION OR ANDRAGOGICAL

 

 

DALMO DUQUE DOS SANTOS
Me. em Comunicação e Cultura PUC-SP
UNIBR – Faculdade de São Vicente
santosduquedalmo@gmail.com

 

RESUMO

A educação iniciática é o processo de ensino-aprendizagem de exploração da consciência. É um processo andragógico, que é o inverso do processo pedagógico, voltado somente para o intelecto. Sua prática vem desde a Antiguidade e vem sendo usada há séculos na formação de ativistas de núcleos religiosos e filosóficos. Nela, a relação entre mestre e discípulo ocorre pela cumplicidade e pela realização de provas de natureza moral. Assim, podemos entender porque todos podem ser professores, mas nem todos podem ser educadores; e também porque existem crianças que são adultos e adultos que não deixaram de ser crianças.


PALAVRAS-CHAVE:
Educação iniciática. Andragogia. Processo Andragógico.


ABSTRACT

The initiatory education is the process of teaching and learning conscious ness exploration. It is an andragogical process, which is the inverse of the educational process, facing only the intellect. Its practice has existed since ancient times and it has been used for centuries in the formation of religious and philosophical core activists. In it, the relationship between teacher and student occurs through the complicity and through conducting tests of moral nature. So we can understand why everyone can be teachers, but not all can be educators; and also because there are children who are adults and adults who continues to be children.


KEYWORDS:
initiatory education. Andragogy. Andragogical process.

 

Iniciação ou Andragogia é a prática educativa utilizada em núcleos filosófico-religiosos que visa, sobretudo, despertar a consciência e, consequentemente, a formação de discípulos, agentes multiplicadores de uma determinada doutrina.

A iniciação é idêntica no que diz respeito à sua essência educativa e varia somente nas suas aplicações culturais, sendo comum tanto nas simples práticas primitivas tribais até as mais sofisticadas instituições sacerdotais. O pagé indígena, o feiticeiro ou curandeiro tribal, o padre, o pastor protestante, o xamã, o bruxo, o mago, o gurú, o pai-de-santo, a rezadeira ou benzedeira, todos são iniciados em suas respectivas áreas de conhecimento, obedecendo a princípios e regras educativas necessárias ao exercício de suas funções ou papéis. Ela também ocorre nas particularidades domésticas da iniciação sexual, principalmente entre mães e filhas, bem como na transmissão oral de tradições familiares, nas habilidades artesanais e profissionais de pais para filhos.

 

Nas civilizações teocráticas da Antiguidade oriental, esse tipo de prática educativa foi predominante porque a camada sacerdotal tinha grande influência social e política. O sacerdócio era um status diferenciado e altamente prestigiado nessas sociedades.

 

A introdução da educação iniciática oriental no mundo ocidental se deu por meio do contato da civilização greco-romana com as culturas do Egito, da Índia e da China. Sábios gregos como Heródoto, Platão e Pitágoras frequentaram núcleos iniciáticos orientais. Mas a própria metodologia de ensino de Sócrates (a maiêutica e a ironia) funcionava como um processo de iniciação no qual o discípulo tinha que romper barreiras e obstáculos para vencer etapas de aprendizagem. De todos esses sábios do Ocidente, Pitágoras foi o que mais se destacou, criando uma escola iniciática de grande prestígio na qual se ensinavam ao mesmo tempo o conhecimento racional, o fenomenal exterior (exotérico) e o fenomenal interior ou emocional (esotérico). A Matemática pitagórica tanto abrange o aspecto racional do universo (geometria) como o aspecto místico, como a teoria da perfeição numérica setenária.

 

Na Idade Média, em plena Era Metafísica, a educação iniciática voltou a ser praticada nos círculos de elite, como contestação e alternativa ao monopólio cultural teológico da Igreja (ordens religiosas em mosteiros e conventos). Nessas sociedades secretas ocultistas, os homens cultos e inquietos se reuniam para aprender e desenvolver conhecimentos proibidos. A Maçonaria é um exemplo desses núcleos, cuja origem foi a corporação de ofício dos pedreiros ou construtores ( do francês “masson” ou fazedor de massa).

 

Na Renascença, essas sociedades secretas se propagaram em função do relativo clima de liberdade estabelecido em cidades comerciais e pelas revoltas contra os abusos de poder do clero católico (Reformas). Nomes famosos como Galileu, Leonardo Da Vinci, Rafael, Miguelangelo foram iniciados nos mistérios metafísicos dessas escolas esotéricas e deixaram transparecer em suas obras os reflexos desses conhecimentos.

 

Com o advento do iluminismo e das Revoluções Liberais, as escolas iniciáticas perderam muito de sua influência devido ao estabelecimento das liberdades civis. Mesmo assim, sabe-se que muitos desses movimentos foram pensados e tramados em núcleos iniciáticos ou pelos seus ex-alunos.

 

No mundo contemporâneo, com as crises existenciais geradas pelo clima de incerteza, as escolas iniciáticas ainda sobrevivem e em determinados setores avançam como alternativa educacional da chamada Nova Era, do III Milênio.

 


CARACTERÍSTICAS MAIS COMUNS DA EDUCAÇÃO INICIÁTICA

 

    • -Ocultismo, misticismo, mistérios, enigmatismo e simbolismo;
    • -Busca do conhecimento das relações e inter-relações entre o Homem, Divindades e a Natureza;
    • -Diferenciação entre o conhecimento Exotérico e o conhecimento Esotérico;
    • -Relação de confiança entre mestre e discípulo;
    • -Regras disciplinares e de conduta (silêncio, jejum, meditação, olhar etc.);
    • -Progressão gradual dialética em etapas (graus hierárquicos);
    • -Instrumentos rigorosos de avaliação probatória;
    • -Diferenciação metodológica entre a pedagogia e a andragogia.

 

Enquanto a pedagogia está voltada para a educação existencial das crianças, a andragogia volta-se para o aperfeiçoamento consciencial dos adultos. Para tanto, esta última lança mão de métodos diferenciados da educação infantil, capazes de amadurecer o indivíduo biologicamente já desenvolvido, porém emocionalmente imaturo, por meio do processo de despertamento.

 

Essa metodologia consiste basicamente na reversão do conhecimento e no aprofundamento de experiências, do plano exotérico para a dimensão esotérica. O conhecimento esotérico está inserido no rol dos principais tipos de conhecimentos manifestados na experiência humana, a saber: o mágico, o empírico, revelado, lógico-racional, o experimental, e o intuitivo. O esoterismo enquadra-se, portanto, na esfera da revelação místico-religiosa, da qual provém a maioria dos ensinamentos espiritualistas ministrados pelas escolas iniciáticas tradicionais e também pelas principais religiões históricas das civilizações. De acordo com Platão e sua analogia sobre o efeito moral do conhecimento nas pessoas, a Verdade é como uma luz que ofusca a visão do expectador que se habituou à escuridão de uma caverna escura. Ele vai se adaptando gradualmente à medida que faz incursões de olhos vendados até que possa finalmente encarar a luz sem nenhuma proteção. A venda nos olhos é o exoterismo; tirar, por sua vez, a venda dos olhos é processo de iniciação esotérica.

 

Todas as religiões e escolas filosóficas espiritualistas, em todas as épocas, guardam duas formas básicas de expressão social: uma esotérica, voltada para os setores mais intelectualizados, cuja minoria tende sempre a formar suas elites, corporativas ou não; e outra exotérica, voltada para as massas, cuja maioria limitada intelectualmente assume significados simbólicos e ritualísticos mais acessíveis ao seu nível de compreensão. Isso significa que as religiões e filosofias possuem conhecimentos complexos que precisam ser, de uma forma ou de outra, vulgarizados, quase sempre em forma de dogmas e sacramentos cerimoniais.

 

Tudo isso, entretanto, só amplia ainda mais o fascínio que o ser humano tem pelo conhecimento esotérico. Menos palpável e realista do que os conhecimentos lógico-racional e empírico, ele não fornece provas materiais dos fatos, porém gera em todos nós uma profunda confiança na imaginação e na capacidade filosófica de cultivar as possibilidades do desconhecido. A mente humana não se alimenta apenas de convicções lógico-racionais. Nossa autorrealização depende do entendimento e da compreensão de muitas outras coisas que estão fora dessa esfera limitada da cognição racional. Além do pensamento, estão inúmeras outras experiências ainda não decifradas e que se escondem no universo dos nossos sentimentos e emoções. Somente quando estivermos suficientemente equilibrados nas três áreas vivenciais é que poderemos conviver com o conhecimento pleno e absoluto das coisas. Por enquanto, teremos que viver na relatividade. Enquanto isso, não há nada de mal especularmos nesse terreno oculto e atraente do mundo das ideias, da esorealidade da qual falava Platão.

 


O MEDO, A NECESSIDADE E A DÚVIDA:
a educação iniciática no roteiro de um filme

Entender e compreender sempre foram coisas diferentes no esforço humano para ler o grande texto do mundo. Os fenômenos que brilham diante dos olhos nem sempre repercutem da mesma forma nas mentes e nos corações. São ritmos de amadurecimento que os gregos antigos diferenciavam utilizando a metáfora do tempo: kronos, para as coisas exteriores e kairós, para as coisas interiores.

 

É assim, como diz Huberto Rohden em Educação do Homem Integral, que a Creação permite que as creaturas conheçam a natureza externa e interna, o Uno e o Verso. Tudo isso pode parecer complicado, mas é só aparência ou ilusão. Tudo se descomplica quando a vida flui com simplicidade, mesmo quando tudo se mostre de forma complexa e inatingível. Não são as coisas, somos apenas nós, nos debatendo para aceitar a verdade.

 

Há muito, muito tempo no Reino Subterrâneo, onde não existem mentiras ou dor, viveu uma princesa que sonhava com o mundo dos humanos. Sonhava com o céu azul, a brisa suave e o brilho do sol. Um dia, burlando toda a vigilância, a princesa escapou. Uma vez do lado de fora, a luz do sol a cegou… e apagou da sua memória qualquer indício do seu passado. A princesa esqueceu quem era e de onde veio. O seu corpo sofria de frio, doença e dor. E no decorrer dos anos, ela morreu. Entretanto, seu pai, o Rei, sabia que a alma da princesa retornaria, talvez em outro corpo, em outro lugar, em outra época. E ele esperaria por ela, até seu último suspiro, até que o mundo parasse de girar… O LABIRINTO DO FAUNO. Data de lançamento 1 de dezembro de 2006 (1h 52min) Direção: Guillermo del Toro. Nacionalidades Eua, Espanha, México

 

Assim, com esse relato cheio de simbologias e mistérios, começa a fantástica narrativa fílmica do diretor Guillermo Del Toro. A película foi concebida originalmente como metáfora política das lutas entre o totalitarismo e a liberdade na Espanha dos anos 1940, quando o país sofre a sua mais terrível prova desde a decadência mercantilista. Depois do conflito civil, no qual foram mortas mais de um milhão de pessoas e também serviu de ensaio para a II Guerra Mundial, o país mergulha nas trevas do fascismo franquista; matter1entretanto, ainda há a resistência dos guerrilheiros esquerdistas escondidos nas montanhas. É nesse ambiente repleto de perigos, mistérios e ciladas que ocorre essa enigmática fábula que fala da educação do corpo e da alma.
Ensina pela linguagem artística o que é e com funciona a educação iniciática; essa andragogia secreta do mundo íntimo, que acontece paralelamente na experiência social humana. Muito útil para a compreensão da moral e das verdades universais. Atentem para o nome e as características do livro que a menina Ofélia recebe do Fauno e como ocorrem as revelações contidas nele.

 

Diferente dos graus horizontais e previsíveis da pedagogia intelectual, a graduação andragógica ou espiritual ocorre no terreno vertical do imprevisível, como na Parábola do Semeador: A sala de aula é a Natureza e as lições são as circunstâncias da vida. Não há como fugir sem pagar o terrível preço da alienação. É o ser e o destino. O primeiro grau é a água (neutra, indefinida e sem gosto), o segundo é a lama (tem gosto, mas ainda está indefinida entre o sujo e o limpo) e finalmente o terceiro grau: a luz, que se define e distingue completamente dos demais, por que não mais se suja ou é impedido por nada que seja material.

 

Entre esses três graus de transformação pessoal, ocorrem as provas mais terríveis da experiência humana: a necessidade, o medo e a dúvida. São as três fases do relógio da existência (infância, vida adulta e velhice) numa só circunstância consciencial (a bússola). Ao se passar pelas provas vivenciais da iniciação andragógica, atinge-se, respectivamente, a pureza das crianças, a coragem dos adultos e a serenidade dos mais velhos. Não importa se somos crianças ou adultos, pois a iniciação não depende somente do intelecto ou da experiência do mundo social, mas, principalmente, do sentimento da coragem e os valores positivos da emoção, ou seja, da capacidade de fazer escolhas e usar o livre arbítrio. Não importam as situações, não importam as aparências, as tradições e os preconceitos. O que vai predominar é sempre a verdade, custe o que custar.

 

Como bem disse alguém na internet:“O Labirinto do Fauno” deve ser apreciado com muita atenção, os detalhes importantes estão meio que escondidos. E cabe cada um decidir o que é real e o que não é.

 


REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS

ARMOND. Edgard. Iniciação Espírita. São Paulo: Aliança, 2010.

ROHDEN. Huberto. Novos rumos da educação. Martin Claret: São Paulo, 2005.

SCHURÉ, Edoard. Os grandes iniciados. São Paulo: Madras, 2011.


DOCUMENTOS ELETRÔNICOS

O LABIRINTO DO FAUNO. .http://www.adorocinema.com/filmes/filme-57689/ Acesso em junho de 2013.