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Ensino Superior versus Treinamentos Corporativos características, expectativas e necessidades dos[…]

Ensino Superior versus Treinamentos Corporativos
características, expectativas e necessidades dos docentes e discentes

Higher Education against Corporate Training
Characteristics, needs and expectations of teachers and students

Roberta Pallotta Trigo

Especialista em Administração e Marketing
Faculdade de São Vicente – UNIBR

roberta.trigo@unibr.edu.br

RESUMO

O presente material visa analisar os comportamentos tanto de professores e treinadores em seus ambientes de trabalho, como de alunos e participantes de treinamentos em suas atividades de aprendizagem. O escopo deste trabalho abrange os aspectos motivacionais de discentes e docentes e qual a metodologia aplicada para aprimorar o processo estudantil. Discute-se também as metodologias andragógicas, amplamente utilizadas em programa de treinamento e que, quando aplicadas em sala de aula, contribuem para o enriquecimento do conteúdo.Um destaque importante deste conteúdo é quando se comenta sobre a necessidade de os professores conhecerem previamente as características individuais dos alunos, desenvolvendo suas aulas com o objetivo de atingir as expectativas individuais e coletivas. Entendemos como discente todo aluno ou participante de treinamento e como docentes, professores e multiplicadores/instrutores de treinamentos.

Palavras-chave: Andragogia. Docência. Treinamento. Motivação. Aprendizagem.

ABSTRACT

This material is intended to analyze the behaviors of both teachers and coaches in their work environment, as students and training participants in their learning activities. The scope of work includes motivational aspects for learners and teachers and what methodology to improve student process. We also discuss the andragogical methodologies, widely used in the training program and which, when applied in the classroom, contribute to the enrichment of the content. A important highlight of this content is when it comments on the need for teachers to know in advance the characteristics individual students by developing their classes in order to achieve individual and collective expectations. We understand how any student or student participant training and how teachers, teachers and multipliers / trainers training.

Key-words: Andragogy, Teaching, Training, Motivation, Learning.


INTRODUÇÃO

O objetivo deste trabalho é comparar as competências exigidas de um profissional de treinamento corporativo (palestrante) com um professor de nível superior. Em diversas situações nas quais pude acompanhar vários profissionais das duas áreas, percebi que, embora tais competências e conhecimentos exigidos em cada um sejam similares, professores e palestrantes possuem particularidades nem sempre presentes num mesmo indivíduo.

O convívio com o aluno, a postura corporal, a didática empregada nas aulas e o objetivo do programa ministrado, o modelo de gestão e até mesmo a vestimenta e o vocabulário, seja em um treinamento ou em uma disciplina de um curso em nível superior, diferem-se em parte.

Com relação ao convívio, por exemplo, o professor mantém um convívio contínuo com seu aluno, o qual pode perdurar por quatro anos; já no caso do facilitador ou palestrante, a convivência é menos duradoura: treinamentos corporativos tendem a possuir carga horária entre 8 a 16 horas, raras as situações as quais excedem esses números, e quando isso ocorre, as empresas de treinamento revezam seus instrutores evitando, dessa forma, estressar o relacionamento “aluno – facilitador”.

Os objetivos de programas de treinamentos e aulas em nível superior também se diferenciam. Treinamentos corporativos têm por objetivo o aprendizado prático, com aplicação imediatista, sem muitas fundamentações teóricas; acredita-se que a própria prática em sala de aula promova uma reflexão conteudista acerca dos assuntos explorados, instigando o aprendizado contínuo, não somente sobre o assunto relacionado ao contexto do programa como também uma visão holística do mundo corporativo. Já em sala de aula, com uma abordagem filosófica, há preocupação na formação do aluno e nem tanto na aplicabilidade dos assuntos apresentados.

É comum práticas independentes dos professores em sala de aula, sem a preocupação de elencar seus conteúdos com os demais abordados no mesmo semestre; poucos são aqueles que promovem a interdisciplinaridade. Encontram-se disciplinas díspares, não sincronizadas e desconexas sendo ministradas em mesmo período, prejudicando a compreensão do aluno. Qual a aplicabilidade disto? Pensa o aluno.

O modelo de gestão aplicado em sala de aula em nível superior também difere, e muito, de um programa de treinamento; no primeiro, o professor assume o estado de EGO PAI, que, segundo Kertész (1987), é crítico, mandatório e dono da verdade; por conseguinte o aluno, o estado de EGO CRIANÇA, o qual, de acordo com a teoria da análise transacional, Kertéz (1987) são estilos opostos. Sempre que o estado de EGO PAI se manifesta, há, inconscientemente, um convite a manifestar no outro o seu contraponto, simbolizado no estado de EGO CRIANÇA. Esta relação, bem comum em ambientes familiares, não se aplica, de forma alguma, em ambientes corporativos ou em relações profissionais de trabalho. No momento que o aluno expressa seu estado de EGO CRIANÇA, ele busca no professor uma relação de proteção totalmente permissível e favorável ou pode-se buscar uma cumplicidade. O Estado de Ego Criança não assume seus próprios atos, apresenta uma fuga de responsabilidades o que se reflete sobre a postura do aluno em sala de aula, além de outras reflexões e comparações como a postura do docente (ou palestrante) diante da plateia. Um adulto atuando como CRIANÇA, tende a se reprimir, a se desmotivar, sem expressar sua capacidade inovadora.


COMPARATIVO COMPORTAMENTAL: PROFESSOR UNIVERSITÁRIO E PALESTRANTE DE TREINAMENTO

Historicamente, os primeiros cristãos foram também os primeiros professores de História, porque “professavam”, isto é, declaravam publicamente a sua fé, ainda que lhes pudesse custar a vida. A partir de certa época, um professor passou a ser aquele que “professava”, ou seja, declarava publicamente possuir conhecimentos em determinada área do saber e podia transmiti-los. Esse pensamento segue até hoje em determinadas áreas no ensino superior.

Segundo Perissé (2010. p. 33),

a origem da palavra não é bem certa; sabe-se que ela formou-se a partir do radical latino professum, supino deprofiteri (aquele que professou, que tomou ordens religiosas e que, por ser membro da igreja, podia proferir sermões publicamente, podia lecionar), formada por fateri (confessar, conhecimento, saber, aquilo que só a Igreja possuía), mais o prefixo pro- (diante, com o sentido de “diante de todos, à vista”) ou seja profiteri seria “confessar diante de todos”, “proferir a palavra diante de todos” ou ainda “declarar diante de todos”.

Outra análise é sobre a palavra “fateri”, do germânico arcaico “fader”, que, por sua vez, origina-se do grego “pater”, “pai”, ou seja, professor também é aquele que age e fala em lugar do pai. Isso explica, provavelmente, os relacionamentos existentes entre aluno e professor, a figura do tutor, do saber. De certo modo, o professor é aquele que ensina, educa.

Segundo Gil (2006), durante muito tempo não houve preocupação com a formação do professor atuante no ensino de nível superior. Excetuando-se, nesse caso, o curso de pedagogia, no qual a maioria dos professores possui formação na área da educação.

As crenças para se definir um bom professor em nível superior estavam baseadas em “quem sabe ensina” (GIL, 2006, p 19) ou o ainda “o bom professor nasce pronto”. Somente em 1965, o Conselho Federal de Educação definiu a efetiva implantação da pós-graduação no Brasil, sendo então obrigatória para os docentes a formação em sua própria área de atuação.

Em muitos cursos de mestrado, considerados atualmente como a principal ferramenta para a formação do docente, não se contempla a formação pedagógica, focalizando-se, exclusivamente, a área de pesquisa orientada pelo tema. Essa carência na formação dos docentes acarreta, em alguns casos, dificuldade de ensinagem que, de acordo com Polity (2002) é diferente da dificuldade de aprendizagem, visto que a primeira é em decorrência da dificuldade do professor se expressar e atingir seu público alvo.

… um correspondente para a dificuldade de aprendizagem do aluno, enunciada na fala do professor e que se refere à sua prática, que aqui denomino dificuldade de ensinagem. (POLITY, 2002, p. 21)

Polity (2002) define dificuldade de aprendizagem como:

Dificuldade de aprendizagem é um termo genérico que se refere a um grupo heterogêneo de desordens, manifestadas por dificuldades na aquisição e no uso da audição, da fala, da leitura, da escrita, do raciocínio ou das habilidades matemáticas. Problemas de controle de comportamento, percepção e interação social podem coexistir. (POLITY, 2002 , p. 23).

Suas causas são inúmeras:

As dificuldades de aprendizagem têm causas e desenvolvimentos múltiplos, […] Ela pode ser tanto orgânica, ou intelectual/cognitiva, quanto emocional(incluindo-se ai a estrutura familiar/relacional. (POLITY, 2002, p, 23).

Em resumo, a autora define a dificuldade de aprendizagem como uma síndrome biopsicossocial, calcada em algumas constituintes básicas: a criança, a família, a escola e o meio social.

Pautando-se nessas definições, o professor deve compreender o seu meio estudantil para conseguir promover a integração dos alunos, minimizando as possíveis causas da dificuldade na aprendizagem. Quando o docente não se orienta para as questões acima comentadas, surge, segundo Polity (2002, p. 29), a “dificuldade de ensinagem”.

[…] a utilização do termo dificuldade de ensinagem no lugar de dificuldade de ensinar. Optei por essa distinção, pois penso que a dificuldade de ensinar refere-se apenas a transmissão de conteúdo específico. Assim, por exemplo, se não conhecemos física quântica, temos dificuldade de ensiná-la. […] Já a ensinagem a meu ver, é basicamente relacional, pressupondo interação. Além do processo motivacional […] ela refere-se a uma comunicação interativa […] Supões relacionamento e considera as trocas emocionais que permeiam o ato de ensinar. (POLITY, 2002, p. 29)

Um exemplo disso é comentado por Cozzo(, 2006, p. 196) “O fato é que nosso atual modelo de formação está pautado na escola filosófica sofista. Logo, por princípio, não se trata de formação, mas de informação.” Segundo tal autor, o professor em nível superior, talvez pela falta de orientação pedagógica, “alimenta” seus alunos com uma série de informações técnicas sem se preocupar com a retenção do conteúdo; sem certificar-se do processo de aprendizagem. O modelo de aula não interativo e autocrático, ministrado por muitos professores de nível superior, inibe o aluno a expor seus comentários, causando, assim, certo distanciamento entre professor e aluno; diferenciando-se, dessa forma, do modelo dialógico conduzido pelos palestrantes de treinamento, os quais incentivam a participação e integração do grupo.

Com isso, observa-se a carência na qualificação do professor. Muitos sem formação pedagógica possuem muito conhecimento técnico sobre o assunto, mas sem experiência e habilidade em transmitir seus conhecimentos. Seu papel não é só o de ensinar, mas auxiliar no processo de aprendizagem do aluno, em sua capacitação profissional, desenvolvendo habilidades nos alunos, nem sempre relacionadas exclusivamente à sua disciplina, mas instigando-os a pensar, pesquisar e aprimorar-se, envolvendo-os no processo de aprendizagem.

Gil (2011) comenta sobre os traços pessoais, intelectuais e profissionais necessários para o professor eficaz, enfatizado sobre a importância da paixão pelo que faz, da empatia no relacionamento com o aluno e o papel do líder participativo em sala de aula, que impactariam na motivação do aluno, consequentemente, aumentando o envolvimento dos discentes, propiciando e criando, com isso, um ambiente de melhoria para o aprendizado eficaz.

Dos traços pessoais, Gil (2011) destaca que um professor líder afeta positivamente as vidas não somente dos estudantes, mas também dos familiares e amigos. Um professor líder é aquele que demonstra humanidade, respeito, empatia, relacionamento e senso de justiça. Tais traços interferem principalmente na relação interpessoal do professor com o aluno, incentivando, deste modo, a participação ativa do discente nas aulas.

Gil (2011) comenta também a importância de traços intelectuais, tais como: conhecimento teórico, conhecimentos sociais derivados de sua experiência do dia-a-dia e possuidor de capacidade intelectual metacognitiva, comunicador, estratégico e responsivo. Esses estudos, que tratam da formação do professor, levaram à construção do Modelo Bidimensional Ensino Universitário Efetivo. Para Gil (2011, p.28), “a qualidade do ensino resulta de duas dimensões: da habilidade de um professor universitário em criar um estímulo intelectual (Dimensão 1) e da empatia interpessoal com os estudantes (Dimensão 2).”

Dessas duas dimensões, pode-se estabelecer a relação entre elas com base em um gráfico sendo o eixo Y (vertical) a Dimensão 1 – Estímulo Intelectual e o eixo X (horizontal) a Dimensão 2 – Relacionamento Interpessoal. Quanto maior o relacionamento professor/aluno, maior se torna o estímulo intelectual do aluno na busca pela resposta e isto fará a grande diferença em sala de aula.

Esse mesmo aspecto também é visível em palestras e treinamentos, pois o instrutor de treinamento possui um papel de multiplicador, repassando seu conhecimento ao aluno que aplicará tal conteúdo apresentado em seu dia-a-dia profissional; agindo assim como um facilitador no processo de aprendizagem. Para BELLAN, (2005, p. 56) “O papel do facilitador é apresentar informações através de técnicas de ensino e criar um ambiente adequado para a aprendizagem ”

O facilitador auxilia o aluno no processo de mudança, faz com que este analise o seu mundo, externalize a sua forma de pensar, para que juntos possam construir um pensamento único, uma nova verdade.

Bellan (2005, p. 56-57) afirma que as tarefas de um facilitador se diferenciam de um professor quando:

1. Comunicam-se com mais eficiência
2. Promovem o entusiasmo pelo aprendizado
3. Demonstram a importância prática do assunto a ser estudado
4. Propagam a sensação de que aquele conhecimento fará diferença na vida dos alunos
5. Transformam-se num orientador de atividades em grupos
6. Passam a sensação de que aquela atividade está mudando a vida de todos e não apenas acrescentando informações inúteis
7. Transmitem força e esperança

Em programas de treinamentos, os instrutores ou facilitadores utilizam-se do método socrático, que consiste na multiplicação de perguntas, induzindo no interlocutor a descoberta de suas próprias verdades e na conceituação geral do objeto. De acordo com COZZO (2006, p. 196), Sócrates disse a Platão que jamais dera uma única aula em toda sua vida; ele disse que não era necessário “ensinar” porque as pessoas já sabiam tudo o que havia para se saber, apenas não tinha consciência disso.

A prática de treinamentos corporativos exige e promove o debate em sala, instiga o aluno a pensar, a participar, envolvendo-se no desenvolvimento do tema de modo que sua aplicação se torne visualizável, palpável e mensurável, seguindo deste modo o estilo da maiêutica socrática.

Segundo Cozzo (2006), a formação de um multiplicador de treinamento dar-se-á principalmente pela sua habilidade na oratória, capacidade na transmissão dos conteúdos e obviamente conhecimento no assunto; exigindo além das competências técnicas, o prazer de estar com as pessoas e vê-las descobrir coisas sobre si mesmas.

Tal conhecimento exigido, não necessariamente fundamentado em grandes teorias acadêmicas, mas sim na vivência prática, aborda a temática dos conteúdos pelo prisma dos participantes, focalizando as necessidades de seu interlocutor. Deste modo, o discurso do palestrante fica alinhado às expectativas dos participantes, pois focaliza suas necessidades pontuais.

Para Cozzo (2006) mais importante que o conteúdo programático, é o prazer do profissional de treinamento em se dedicar aos seus alunos, transformando-os; permitindo que eles apresentem seu modo de ver o mundo, auxiliando no processo de mudança ou reforço.

A forma da apresentação é também em alguns casos até mesmo mais valorizada que seu próprio conteúdo. Ela envolve desde a postura do palestrante como toda a infraestrutura agregada ao treinamento. Os serviços adicionais, como recursos multimídia, almoço, material didático, apresentado o intervalo para o café com seus quitutes, favorecem a avaliação positiva do treinamento. Apenas uma apresentação positiva do instrutor não valoriza o programa de treinamento, visto que as expectativas dos participantes se estendem aos serviços agregados.

A técnica de apresentação e oratória é um elemento muito valorizado em programas de treinamento, devendo o palestrante saber trabalhar sua gesticulação corporal, voz, linguagem e a empatia com os participantes. Em um programa de treinamento é mandatório que todos os integrantes do curso participem ativamente; “cabe ao palestrante desenvolver seu lado artista” (Gil, 2011, p.34). O facilitador tem um papel fundamental nesse processo; ele é o ativador de todo o processo de aprendizagem em sala de aula.

Os instrutores, de uma maneira geral, preparam-se para ministrar treinamentos para adultos de forma a incorporar em sua didática diversas ferramentas as quais possibilitem o envolvimento do educando no processo de aprendizagem. O instrutor tem um segundo papel que é de compartilhar a sua experiência de vida profissional aos seus alunos, os quais em sua maioria são atuantes em área correlata e estão ali para seu aperfeiçoamento profissional. Segundo BELLAN (2005, p. 61) “O facilitador deve saber que apenas seu conhecimento, um livro didático, recursos audiovisuais etc, não garantem influenciar o indivíduo adulto para a aprendizagem.”

É sabido que adultos apreendem de forma diferenciada da criança e uma importante área da pesquisa educacional se refere às semelhanças e diferenças entre a aprendizagem do adulto e da criança. Ainda hoje a Andragogia é pouco estudada nos cursos de pedagogia. Para BELLAN (2005, P. 20), “Andragogia é a ciência que estudo como os adultos aprendem. E quem primeiro usou esta nomenclatura foi o educador alemão Alexander Kapp, em 1833. “

De acordo com tal autor, a andragogia questiona o modelo da pedagogia aplicado à educação de adultos, porque entende que o adulto é sujeito da educação e não o objeto desta. Isso também é afirmado por Paulo Freire: “Ensinar não é transferir conhecimento, mas criar as possibilidades para a sua produção ou a sua construção”. (FREIRE, 2011, p. 47).

Ambos propõem a figura do professor atuando como um facilitador do aprendizado, compreendendo e respeitando as individualidades dos alunos, crenças, carências, conhecimento e experiências anteriores. É fato que algumas habilidades ou capacidades de aprendizagem de um indivíduo aumentam durante os primeiros anos de sua vida como sua coordenação motora e resistência física, acuidade visual, seus conhecimentos gerais e sua memória de modo que o ser, até tornar-se adulto, passa por constantes transformações físicas e intelectuais. Tais mudanças influenciarão no seu modo de agir, pensar, e relacionar-se com o meio.

Enquanto a criança é, de certa forma, obrigada a frequentar a escola, os adultos têm a liberdade de escolha, abandonando as situações de ensino que lhes sejam insatisfatórias. Em ambos os casos, os professores precisam se perguntar sobre as necessidades presentes e as habilidades de seus estudantes, seus objetivos e o que eles esperam alcançar.

Existe outra teoria sobre a educação das crianças que diz que estas aprendem por imitação e espelhamento. Isso porque elas ainda não são capazes de “entender” do mesmo modo que uma pessoa mais experiente. Elas pouco questionam o que está sendo apresentado, expressando o seu verdadeiro Estado de Ego Criança. KÉRTÉZ (1987, p. 34) “A criança é o primeiro estado de ego a existir […].O estado de Ego é componente biológico da personalidade. A aprendizagem também se agrega a ela.”

Uma criança aceita sem questionar por não possuir conhecimentos anteriores que possam ser comparados, surgindo assim os questionamentos sobre a verdade. Muitas vezes vemos professores dizendo aos estudantes, de ensino superior, o que deveriam dizer, fazendo ligações às quais poderiam fazer por si próprios e, geralmente, ignora-se a importância da experiência e competência de cada um. Nesse caso, torna-se presente o Estado de Ego Pai que conflita com o Estado de Ego Adulto; e se fossem detectados antecipadamente o estado de ego do outro, haveria mais facilidade em alterar o nível da conversa, buscando uma inversão de estados de ego, escolhendo aquele considerado mais adequado para cada situação/relação.

Um adulto pode “entender” os fatos de outra forma. Baseia seu aprendizado em suas experiências vivenciais e necessita de um modo menos rotineiro para aprender novos assuntos de um jeito menos rotineiro, considerando-se inadequado aplicar os métodos escolares tradicionais.

Com isso, há posturas bem diferenciadas na forma de conduta de um professor em nível superior e um palestrante de treinamento. O primeiro se apodera da figura do estado de Ego Pai; em reciprocidade, o aluno vem com seu estado de Ego Criança, demonstrado não somente pelo baixo aprendizado, mas pelas posturas comportamentais de submissão, rebeldia com a autoridade, preocupação com os processos avaliativos (notas), transformando, dessa maneira, a relacionamento aluno-professor numa grande negociação de empenho versus nota. Já, quando se refere à postura do palestrante e seus alunos, ambos trazem para a sala de aula seus estados de Egos Adultos, permitindo, dessa forma, uma relação de reciprocidade, comprometimento e engajamento com o aprendizado.


COMPARATIVO COMPORTAMENTAL: ALUNO UNIVERSITÁRIO E PARTICIPANTE DE TREINAMENTO

De acordo com Perissé (2010) a palavra aluno procede do verbo latino alere, referente à alimentação, ao sustento e ao crescimento. O aluno se nutre das palavras do professor, inibindo, assim, a sua capacidade de raciocínio conclusivo.

O aluno, talvez estigmatizado pelo método acadêmico tradicional, já vem doutrinado desde o nível fundamental ao médio por uma metodologia de ensino impositiva, com regras claras e inibindo a exposição do EU aluno. O professor, sempre ditatorial, é o líder absoluto, mantendo um regime disciplinar autocrático.

“O EU (si mesmo, self), segundo Fairchild, é a percepção que um indivíduo tem de sua própria personalidade”. (KERTSÉZ, 1987, apud FAIRCHILD 1949, p. 22)

Essa metodologia é bem aplicada no aluno infante, entretanto, o adulto necessita de mais estímulos diferenciados para a aprendizagem.

No aprendizado entre adultos e crianças, segundo TRIGO ( 2013, p. 56)

1. Os adultos possuem desejo de aprender e forte motivação que os leve a adquirir conhecimentos e/ou habilidades para o seu aprimoramento profissional.
2. Seu desejo de aprender é despertado ou estimulado por influências externas, porém nunca lhes é imposto.
3. Os adultos aprenderão somente o que sentem necessidade de aprender.
4. Necessitam de conhecimentos com a aplicabilidade imediata.
5. Querem ensinamentos simples e diretos.
6. Não têm paciência em ouvir revisões históricas, muita teoria.
7. Querem obter resultados práticos desde o 1º dia de aula.
8. Adultos aprendem fazendo e a retenção dos conhecimentos é mais elevada quando o homem participa ativamente do processo de aprendizagem.Esquecem dentro de um ano 50% do que aprenderam de forma passiva. Em dois anos esquecerão 80%.
9. A aprendizagem centraliza-se em problemas/estudos de casos reais. Essas situações, mesmo que hipotéticas, devem ser extraídas de experiências em empresas, com soluções práticas e precisas às quais possam deduzir princípios.
10. A experiência afeta a aprendizagem do adulto. Os novos conhecimentos devem ser relacionados com suas experiências anteriores e integrados às mesmas; se não houver este ajustamento os adultos tendem a rejeitá-los.
11. Os adultos querem sentir-se responsáveis por sua própria aprendizagem. Necessitam de oportunidades onde realizem uma autoavaliação do seu progresso. Querem sempre saber como estão se saindo no curso, se estão fazendo certo, se o que o grupo concluiu está certo ou não.
12. Os adultos aprendem melhor em ambiente informal. Propiciar jogos e interatividade faz com que os adultos vivencie as teorias apresentadas, o que aumenta a sua capacidade de aprendizagem.
13. Uma variedade de métodos deve ser utilizada. Quanto mais envolvente for o treinamento, mais o adulto se interessará pelo assunto e maior será a sua participação.

Partindo-se da premissa que em sala de aula se deve abordar os princípios básicos da andragogia, visto que se estabelece a relação de egos adultos entre professor e aluno, mas a questão a ser discutida é se o aluno em nível superior possui a maturidade exigida pelo Estado de Ego Adulto para assumir os riscos, responsabilidades inerentes a sua realidade atual. Segundo KERTÉZ (1987, p. 31), “o adulto recebe a informação de fora e de dentro, analisa-a, compara-a com seu “banco de dados” e toma decisões.”

O comportamento Criança é ainda remanescente dentre os alunos em nível superior, principalmente nos primeiros ciclos. Embora exista uma heterogenia em sala de aula, o estado de ego adulto nem sempre é percebido; o importante, nesse caso, é o professor identificar o estado de ego do seu aluno para assim conduzir uma aula dialógica adequada.

Esse comportamento do “aluno criança” difere do participante de treinamento. Este último se expressa por intermédio de o seu estado de ego adulto, o que facilita o papel do facilitador em sala de aula, por permitir manter um diálogo participativo e construtivista. Curiosamente, muitas vezes alunos e participantes de treinamento são as mesmas pessoas, mas mantêm comportamentos diferenciados nas diferentes circunstâncias e situações.

Uma explicação para essa diferenciação entre os estados de egos é que os estudantes “adultos”, em geral, possuem níveis mais elevados e diferenciados de motivação se comparados a crianças em idade escolar. É possível que seus interesses sejam focados em situações práticas direcionadas ao seu dia-a-dia profissional. Conseguem estabelecer uma relação de “ganho” entre o tempo dedicado ao aprendizado e a elevação do saber. São mais críticos e exigentes em relação a seus instrutores. Ao mesmo tempo, eles são mais conscientes da sua autoimagem, comparando-se a si mesmos, como estão no momento e com o estágio anterior de suas vidas, quando pensavam, sentiam (e olhavam) de modo diferente. Identificar onde e como aplicar o conteúdo ministrado em sua vida profissional, é uma premissa constante na mente dos participantes de treinamento.

Outro importante fator na determinação do sucesso na aprendizagem é a motivação do aluno. A motivação é que nos impulsiona para a ação, e tem origem numa necessidade. Assim, à medida que o aluno sente necessidade de aprender, tende a buscar fontes capazes de satisfazê-las, tais como leituras, aulas e discussões. A influência da motivação é facilmente verificável. Alunos motivados aprendem muito mais facilmente que os não motivados. (GIL, 2011, p 14).

Nesse ponto, fundamentalmente, diferem: o fator motivacional que os levou à sala de aula, seja em um treinamento corporativo ou uma formação acadêmica. O participante de treinamento possui características biopsicossociais diferentes do aluno em nível superior. O primeiro é um profissional engajado no mercado de trabalho, ciente de suas obrigações formais com a empresa patrocinadora do curso, e com o desempenho cobrado depois da participação no curso. Até mesmo quando é o próprio responsável pelos seus custos, o compromisso financeiro torna-se mais presente. Ao falarmos dos alunos em nível superior, nem sempre o curso é custeado por ele mesmo; familiares ou bolsas estudantis são práticas bem comuns no meio.

Os objetivos de cada um dos nossos personagens em relação aos seus cursos influenciam na motivação. O objetivo de um programa de treinamento é em curto prazo; os conhecimentos absorvidos pelo participante ao longo do programa serão aplicados na sequência. Treinamentos corporativos visam ao aprimoramento profissional, enquanto os cursos de nível superior têm foco na formação holística do ser humano como um ser social.

O profissional participante de um programa de treinamento tem seus objetivos bem claros, já o aluno de nível superior possui objetivos em longo prazo, o que o torna disperso, sem foco. Muitos estão na sala de aula porque sentiram a necessidade da titulação; todavia, o conhecimento fica em segundo plano, na escala de importância.

Ao se analisar os objetivos de cada uma das áreas, seja de uma universidade ou de programas de treinamento, BELLAN (2005, P. 17) define que “objetivo da universidade é capacitar, formar o aluno para o mercado de trabalho, já o de um treinamento corporativo é capacitar o participante em suas tarefas diárias do trabalho.”

Essa definição ilustra claramente as divergências de pensamento entre a escola e o aluno, enquanto um tem por objetivo a formação do indivíduo, o outro deseja apenas uma titulação e, nesse meio, existem basicamente dois elementos que formam uma equação bastante complexa, cujos mestres matemáticos e filósofos contemporâneos não conseguirão solucionar: professor e avaliação.

O aluno vê no professor uma representação impeditiva para o alcance dos seus objetivos imediatistas: a obtenção do seu diploma. Ele se sente coagido com as ferramentas avaliativas e o professor representa a figura de um carrasco, punindo os que não obtiveram bons resultados nas metodologias avaliativas.


CONSIDERAÇÕES FINAIS

Com base nessas informações, tanto os instrutores como os docentes em nível superior estarão em melhores posições para ajudar aos alunos a aprenderem mais efetivamente se aceitarem as experiências anteriores de seus discentes; identificando tais pontos e o fato de que os indivíduos diferem uns dos outros de várias maneiras, podemos verificar, certamente, as diferenças gerais entre adultos e adolescentes, alunos e participantes de treinamentos.

A aprendizagem é um processo que envolve a pessoa como um todo, atingindo todos os níveis de sua personalidade. Isso equivale a dizer que a aprendizagem provoca modificações no nível emotivo (na maneira de sentir), no nível cognitivo (nos conhecimentos) e no nível motor (nas habilidades) tanto em quem ensina quanto no ensinado; considerar quem é o aluno atuante em sala de aula é premissa básica para o professor atingir seus objetivos.

Nesse ponto, os programas de treinamento se diferem, e muito, das práticas ministradas em sala de aula, pois são desenvolvidos com base nos “gaps” de competência, ou seja, nas necessidades individuais e não uma educação de massa. Há muito é usado em programas de treinamento o chamado levantamento de necessidades em treinamento (LNT). De origem investigativa, visa compreender antecipadamente, as expectativas, necessidades, os desejos e objetivos dos participantes; orienta o facilitador na condução do programa, podendo diferenciar a sua abordagem, aprofundando ou não no tema proposto; entretanto fica uma pergunta: como aplicar esse método em uma cultura de massa? O treinamento se torna mais intimista porque em sala de aula as turmas são reduzidas, já em salas com mais de cinquentas pessoas, a percepção individualizada do aluno pelo professor é prejudicada, impactando negativamente no relacionamento professor – aluno, prejudicando, dessa forma, diretamente no processo final da aprendizagem.

Esse sincronismo de informações (expectativas versus proposta de treinamento) desperta a motivação do treinando, seja este aluno em nível superior ou participante de um treinamento, que é requisito fundamental da aprendizagem. É preciso que ambos queiram atingir os objetivos propostos pelo treinamento ou aula e vejam sentido em fazê-lo.

A maneira de abordar o tema impacta no fator motivacional: mostrar simplesmente o custo dos acidentes de trabalho para a empresa poderia não ser tão motivador quanto mostrar as consequências do acidente para o empregado e sua família. Essa metodologia envolve todos sentidos pelos quais os quais o indivíduo recebe estímulos: É por intermédio dos sentidos que o indivíduo estabelece contato com o mundo que o rodeia e produz respostas, as quais conduzem à aquisição de novos conhecimentos, habilidades ou atitudes. Quanto mais sentidos o treinando utilizar no treinamento, maior será seu envolvimento e maior o grau de aprendizagem, criando assim um clima de envolvimento e comprometimento do aluno nos objetivos do treinamento. Todos esses aspectos levam a melhoria do processo de aprendizagem.

Outro ponto que diferencia a sala de aula de treinamentos são os métodos avaliativos. Em sala da aula, o aluno se sente pressionado pelos resultados da avaliação e não na aprendizagem propriamente dita. Sabe-se que é importante oferecer ao treinando ou aluno e sempre que possível o feedback (devolutiva) de seu processo de aprendizagem. À medida que esteja caminhando em direção aos objetivos, o treinando deve ser informado disso para que possam desenvolver seu CHA (conhecimentos, habilidades e atitudes) ao longo de todo o processo de aprendizagem, que em treinamentos resumem-se em poucas horas, já em cursos de nível superior se estendem por anos.

Esses dois elementos, Professor e Avaliação, surgem na mente do aluno com um entrave para a conquista das metas. Todo o processo avaliativo instituído atualmente pelas universidades impede o aluno de seu processo criativo, não permitindo ao professor aplicar novas metodologias para a mensuração da aprendizagem. O volume de pessoas em sala de aula inibe a participação e o trabalho em grupo, impossibilita o professor a empregar em suas aulas metodologias andragógicas e a despersonificação ou a falta do individualismo em sala contribuem para o desapego do aluno ao programa de curso, diferentemente das posturas dos participantes de treinamento, cujo foco é o trabalho em grupo; turmas reduzidas permitem a participação de todos, instigam o processo criativo. Nesses eventos, a avaliação de aprendizagem é observada na prática, no ambiente de trabalho, estando diretamente ligada ao sucesso profissional.

As turmas de programas de treinamento são bem menos heterogêneas que uma sala em nível superior, tanto em faixa etária, nível sócio/econômico/cultural, facilitando a integração do grupo, diferentemente do que se observa em sala de aula. Devido à discrepância de interesses e valores, os professores possuem grandes dificuldades para promover a integração do grupo.


REFERÊNCIAS

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COZZO, Inês. Fundamentos da formação de multiplicadores In: Boog, Gustavo G.; BOOG, Magdalena (Coord.). Manual de treinamento e desenvolvimento: gestão e estratégias. São Paulo, Pearson, 2006.

FREIRE, Paulo. Pedagogia da autonomia: saberes necessários à prática educativa. São Paulo: Paz e Terra, 2011.

GIL, Antônio Carlos. Metodologia no ensino superior. São Paulo: Atlas, 2006.

_______________. Didática no ensino superior. São Paulo: Atlas, 2011.

KERTÉZ, Roberto. Análise transacional ao vivo. 4. ed. São Paulo: Summus, 1987.

PERISSÉ, Gabriel. Palavras e Origens – Considerações Etimológicas. São Paulo: Saraiva, 2010.

POLITY, Elizabeth. Dificuldade de ensinagem. São Paulo: Vetor Editora, 2002.

TRIGO, Roberta. Manual de formação de multiplicadores de treinamentos. Santos, SP: Sêneca Editora, 2013.